1. 2021 e o Rio Integridade.
O ano de 2021 começou e o Município do Rio criou o “Rio Integridade”, através do Decreto Rio nº 48.349 de 1º de janeiro de 2021.
Segundo o preâmbulo do Decreto, o objetivo é fazer com que o Rio de Janeiro se torne paradigma nas formas de fazer política e gerir a coisa pública, referência nacional em transparência, integridade e combate à corrupção, fazendo com que a Administração Pública esteja voltada, exclusivamente, para a consecução do interesse público, como deve ser.
Para tanto, o programa tem como fundamento a efetivação, na administração municipal, de práticas de integridade pública, por meio da governança e da conformidade, e de práticas de transparência e gestão de dados.
Tais práticas devem obedecer a três pilares básicos de ação: prevenção (prevenir o cometimento de irregularidades e ilegalidades), detecção (detectar eventual cometimento de irregularidades e ilegalidades) e responsividade (responder, solucionar e atribuir responsabilidades àqueles que cometerem irregularidades ou ilegalidades). A esses pilares básicos adiciona-se a participação e controle social como premissas fundamentais do programa.
Dessa forma, o “Programa Carioca de Integridade Pública e Transparência – Rio Integridade” consiste em uma plataforma de propostas de reformas legislativa, administrativa e institucional, no âmbito municipal, com o objetivo de promover um debate público orientado às causas sistêmicas da corrupção e de oferecer soluções permanentes para o seu enfrentamento no longo prazo. O que se deseja, pois, é estabelecer uma verdadeira cultura de integridade na administração pública municipal.
Segundo o referido Decreto, o programa se baseia em três frentes:
1) Desenho institucional: Normatização do Programa e criação do Sistema Carioca de Integridade Pública e Transparência;
2) Arcabouço normativo: revisão e consolidação do arcabouço normativo a respeito dos temas da integridade pública e da transparência;
3) Ferramentas de integridade: implementação de mecanismos de monitoramento e fomento de ações de integridade e transparência.
Isso porque, segundo o Decreto Rio nº 48.349 e o próprio Secretário Municipal de Governo e Integridade Pública, Marcelo Calero Faria Garcia, em entrevista dada à Globo News no dia 04/01/20211, é necessário impedir desvios de dinheiro e de outros recursos públicos, mas não só, também é necessário coibir desvios de finalidade.
Ainda no plano dos objetivos, o Decreto cita a necessidade de combater o conflito de interesses; de garantir o tratamento republicano aos cidadãos, servidores, fornecedores e processos administrativos; de estabelecer um padrão de excelência na prestação dos serviços públicos; e de buscar alcançar a máxima transparência na formulação, na contratação, na execução, no monitoramento e na avaliação de políticas públicas.
Nesse sentido, há estreita e necessária relação entre o programa e a agenda de transformação digital, ou GovTech, na terminologia corrente, uma vez que serão utilizadas tecnologias e soluções inovadoras que possam a um só tempo implementar um governo digital e reforçar o diálogo com o cidadão.
O artigo 1º do Decreto Rio nº 48.349 cria o mencionado “Programa Carioca de Integridade Pública e Transparência – Rio Integridade” e estabelece seus fundamentos e objetivos. Já o artigo 2º estabelece as etapas do Programa, são elas:
a) Instituição do Sistema Carioca de Integridade Pública e Transparência;
b) Revisão do arcabouço normativo vigente;
c) Consolidação do arcabouço normativo administrativo em matéria de integridade pública e transparência;
d) Elaboração e implementação de instrumentos para a garantia da integridade pública e da transparência;
e) Envio ao Poder Legislativo municipal da proposta do Estatuto Carioca da Integridade Pública e da Transparên¬cia, com o objetivo de sistematizar e perenizar o arcabouço consolidado e os mecanismos implementados, em sede de diploma legal idôneo para tanto.
O artigo 3º, por sua vez, institui o Sistema Carioca de Integridade Pública e Transparência, composto pela Subsecretaria de Integridade Pública e pela Subsecretaria de Transparência e Governo Digital, criadas na estrutura da Secretaria de Governo e Integridade Pública, cada qual com as atribuições, competências e estrutura organizacional definidas em Decreto próprio.
O artigo 4º institui o Processo Especial de Revisão Normativa (PREN) para os atos normativos em vigor referentes aos temas da integridade pública e transparência. O PREN tem como objetivo simplificar e, portanto, tornar mais efetivo e operacional, o atual arcabouço, e será detalhado ulteriormente em resolução do titular da Secretaria de Governo e Integridade Pública.
Outrossim, o artigo 5º cria grupos de trabalho (GTs) que ficarão responsáveis pela elaboração de relatório contendo sugestões de textos normativos, medidas e cronograma, conforme aplicável, sobre os temas de Integridade Pública, Governo Digital, Transparência, e Prevenção e Combate ao Assédio e à Discriminação, com o objetivo de elaborar e implementar mecanismos essenciais para a efetividade do Programa.
Vale ressaltar que na mesma data, 01 de janeiro de 2021, foi publicado o Decreto Rio nº 48.351, que dispõe sobre normas de transparência das contratações em âmbito do Poder Executivo municipal, e dá outras providências.
Segundo seu art. 1º, o Decreto tem por finalidade: aprimorar a cultura de transparência pública; franquear aos cidadãos o acesso, de forma aberta, aos dados produzidos ou acumulados pelo Poder Executivo municipal, sobre os quais não recaia vedação expressa de acesso; e fomentar o controle social destinadas à construção de ambiente de gestão pública participativa e democrática e à melhor oferta de serviços públicos para o cidadão;
Nesse sentido, dando cada vez mais atenção à necessidade de transparência e integridade nas contratações públicas, entre as medidas a serem adotadas está o amplo acesso aos cidadãos dos procedimentos licitatórios através da transmissão ao vivo dos que forem realizados sob a forma presencial, por meio do Portal da Transparência do Município do Rio de Janeiro, e disponibilização de link para acesso direto ao sistema eletrônico utilizado no certame, que permite o acompanhamento e o acesso a todos os procedimentos da licitação, no caso do procedimento licitatório ser na forma eletrônica.
Ademais, o Decreto estabelece a necessidade de órgãos da Administração Direta, Autárquica e Fundacional, formularem consulta pública nas licitações que realizarem, quando os valores estimados da licitação ou para um conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas superarem o valor de R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais) ou, independentemente dos valores, sempre que a relevância, pertinência e complexidade do objeto assim o recomendar.
Esse mesmo Decreto estabelece que os órgãos e entidades do Poder Executivo Municipal serão obrigados a disponibilizar na página do órgão contratante, a relação das contratações realizadas em caráter emergencial, em até dois dias a assinatura do ato, independente da data de publicação, algumas informações descritas em anexo ao referido Decreto.
2. O que vigorava antes de 2021, do Rio Integridade?
Em 2019, o Decreto Rio nº 46.195 já estabelecia procedimentos para a responsabilização administrativa e civil de colaboradores externos-pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública Municipal, com base na Lei Anticorrupção (Lei Federal nº 12.846/2013), e em atendimento ao Subeixo IV.6 do Eixo IV, do Decreto Rio nº 45.385, de 23 de novembro de 2018.
O referido Decreto já havia fixado que todos os colaboradores externos-pessoas jurídicas devem se comprometer a atuar de forma ética, íntegra, legal e transparente, e de que todos estavam cientes de que não poderão oferecer, dar ou se comprometer a dar a quem quer que seja, ou aceitar ou se comprometer a aceitar de quem quer que seja, tanto por conta própria quanto por intermédio de outrem, qualquer pagamento, doação, compensação, vantagens financeiras ou benefícios de qualquer espécie que constituam prática ilegal ou de corrupção, seja de forma direta, indireta ou por meio de subcontratados ou terceiros, quanto ao objeto deste contrato, ou de outra forma a ele não relacionada.
Colaboradores externos-pessoas jurídicas são todos aqueles que mantenham relacionamento com a Administração Municipal para a prestação de serviços, fornecimento de bens e materiais, ações de parceria, incentivos e benefícios e afins, contratados e subcontratados com vínculo com a Administração, bem como qualquer tipo de instrumento jurídico firmado com a Administração Municipal.
O artigo 28, inciso IV, parágrafo único do Decreto Rio nº 46.195/2019 menciona a possibilidade do colaborador externo-pessoa jurídica apresentar defesa com informações e documentos referentes à existência e ao funcionamento de programa de integridade, que será analisado e levado em consideração no Processo Administrativo de Responsabilização – PAR. Nesse sentido, em caso de sanção, o art. 44, inciso V, estabelece como fator de subtração de multa a comprovação da existência e aplicação do programa de integridade pelo colaborador externo-pessoa jurídica.
3. Conclusão: o que pode vir adiante.
Tramita na Câmara Municipal do Rio de Janeiro projeto de lei (Projeto de Lei nº 471/2017) que busca tornar obrigatória a implantação do Programa de Integridade às empresas que celebrarem contrato, consórcio ou convênio com a administração pública direta, indireta e fundacional do Município do Rio de Janeiro cujos contratos ultrapassem o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais).
Dito isso, conclui-se que o “Rio Integridade” é mais um passo em direção à gestão adequada de recursos públicos. Assim, os licitantes e contratados da administração pública municipal, direta e indireta, que possuírem mecanismos de integridade em acordo com a Lei Anticorrupção (Lei Federal nº 12.846/2013) estarão um passo à frente de eventuais concorrentes e de futuras demandas de conformidade da própria Administração Pública, considerando o Decreto Rio nº 46.195, publicado em 05 de julho de 2019; o Decreto Rio nº 45.385, publicado em 23 de novembro de 2018, que instituiu o Sistema de Integridade Pública Responsável e Transparente – “Integridade Carioca” e o Sistema de Compliance do Poder Executivo do Município do Rio de Janeiro – “Compliance Carioca”; e o Projeto de Lei nº 471/2017.
Por Victor Athayde e Rafaela Pitta em 06.01.2021
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