Por Isadora Siufi em 20/01/2023
Um tema que desperta muitas dúvidas nos consumidores e nos lojistas que aceitam pagamento com cartão de crédito é o chargeback – não raro, a discussão desse tema chega ao Judiciário, notadamente nos Juizados Especiais Cíveis.
Muitas vezes, a judicialização dos casos de chargeback ocorre por desconhecimento das políticas adotadas para a resolução da disputa entre comprador e vendedor.
Este artigo, portanto, visa esclarecer como funcionam as políticas de chargeback.
A palavra chargeback, na tradução direta para o português significa estorno. Trata-se da contestação de uma compra feita via cartão de débito ou crédito em qualquer estabelecimento comercial, seja loja virtual ou física, feita pelo titular do cartão por meio do banco emissor.
O chargeback pode ser solicitado em casos em que há (i) transações fraudulentas, (ii) erro de processamento na compra ou (iii) desacordo comercial.
Vejamos cada uma das situações:
(i) Fraude: ocorre quando o titular informa ao banco emissor do cartão que não reconhece a transação que veio em sua fatura.
(ii) O erro de processamento: ocorre quando há algum erro no processamento da transação, como quando o titular é cobrado em duplicidade ou quando o valor debitado não corresponde ao da compra.[1]
(iii) Desacordo comercial: ocorre quando a mercadoria não foi recebida pelo cliente, não confere com a descrição ou foi entregue com avarias ou defeitos. Também pode acontecer em casos de serviço não prestado conforme acordado no ato da compra.[2]
Quando algum desses eventos ocorre, o titular do cartão pode, portanto, contestar o lançamento na sua fatura, ou seja, requerer, perante o banco que emitiu o cartão de crédito, que a cobrança seja cancelada.
Muitos bancos, imediatamente após a recepção da reclamação, optam por estornar o valor imediatamente ao cliente, como um “voto de confiança”. Mas, isso não significa que o titular do cartão venceu a disputa.
Isso porque, toda contestação deve ser previamente checada. Para segurança de todos aqueles que fazem parte de um arranjo de pagamento, há de se apurar se a contestação é séria ou se foi feita de má-fé – o que, infelizmente, pode acontecer.
O procedimento pelo qual se verifica se uma contestação é devida ou não é instituído pela Bandeira do cartão de crédito, de modo que pode haver variações de prazos e posturas.
Em regra, as Bandeiras instituem o prazo de até 120 dias contados da data da venda para o cliente abrir um chargeback. Ao receber o chargeback, o Banco se comunica com os demais integrantes do arranjo de pagamento: a Bandeira e o Credenciador (ou Adquirente) e/ou Subcredenciador (ou Subadquirente).
Importa explicar que, dito de forma simples, o Credenciador é o responsável pela liquidação financeira das transações, ou seja, por repassar o dinheiro da conta do Comprador para a conta do Recebedor.
Essa relação entre o Credenciador e os Comprador e Recebedor pode ser intermediada, ainda, por um Subcredenciador, que é aquele que fornece a solução de aceitação de instrumento de pagamento, como, por exemplo, as maquininhas, conectando, assim, os envolvidos.
Com efeito, o Credenciador ou o Subcredenciador, a depender do arranjo de pagamento, é quem tem a relação direta com o Recebedor, isto é, com aquele que aceitou o cartão de crédito como pagamento.
Assim, enquanto o Banco busca subsídios sobre o ocorrido com o Titular do cartão de crédito, o Credenciador ou Subcredenciador busca subsídios com o Recebedor. Cada um colhe da parte com quem tem relação direta as informações e documentos que podem ser úteis à análise do chargeback.
Por isso, é importante que o Recebedor mantenha o registro da regularidade das suas transações, através de documentos como nota fiscal e recibos, bem como das tratativas de resolução de eventuais reclamações de seus clientes.
Ao se resguardar documentalmente, o Recebedor poderá remeter as evidências de regularidade da transação à Bandeira, por intermédio do seu Credenciador ou Subcredenciador e, dessa forma, potencializar as chances de o chargeback ser considerado insubsistente.
O mesmo se diz em relação àquele que inicia o chargeback. Quanto mais evidências ele conseguir apresentar ao Banco de que sua contestação é séria, maiores as chances de lhe ser favorável o resultado da apuração do chargeback.
Uma vez colhidas essas informações de cada Parte da disputa, elas são encaminhadas à Bandeira para análise e decisão.
Nesse ínterim de apuração, é possível que o valor da transação fique “congelado”, por cautela. Isto é, de acordo com as políticas dos Credenciadores ou Subcredenciadores o valor não é repassado ao Recebedor – estabelecimento que fez a venda – até que o chargeback seja decidido.
Caso o chargeback seja considerado válido, o valor da transação contestada é devolvido ao Titular do cartão de crédito, mediante crédito na fatura. Do contrário, o valor é regularmente repassado ao estabelecimento que fez a venda.
Isso explica por que o valor contestado pelo Titular do cartão de crédito por ser, a princípio, estornado, e, mais tarde, voltar a ser debitado. É que quando finalizado o procedimento de apuração, chegou-se à conclusão de que o cliente não tinha razão.
Embora o chargeback seja uma prática muito comum, como dito no início deste artigo, as políticas por trás disso não é um assunto popularizado, e a falta de conhecimento pode provocar a proposição de demandas infundadas ou contra as pessoas erradas.
A equipe de Direito do Consumidor do David & Athayde tem expertise na condução de demandas envolvendo chargebacks e, a par dessas breves considerações, esperamos ter contribuído para o esclarecimento do tema.
[1] https://zoop.com.br/blog/pagamento/o-que-e-chargeback/
[2] https://www.idinheiro.com.br/financaspessoais/desacordo-comercial/