Por João Pedro Goulart em 14/02/2023
Após o primeiro mês de governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou compromisso com a pauta ambiental e assinou alguns decretos que confirmam a previsão ambientalista de seu mandato (por exemplo, a alocação de R$ 3,3 bilhões no Fundo Amazônia). Porém, a tônica dos investimentos em combustíveis sustentáveis ainda é incerta.
Após Lula ter citado biocombustíveis e não a eletrificação na COP 27, não se sabe exatamente qual será a tônica energética brasileira dos próximos quatro anos, sobretudo após o Brasil ter anunciado na COP 26 – ainda no governo Bolsonaro – que almejava reduzir em 50% as emissões de gás carbono até 2050.
Diante disso, sabendo que o setor de transportes é responsável por mais de 10% das emissões de CO2 no Brasil; e que os carros elétricos têm a chancela de zero emissão, as montadoras se movimentam para saber se Lula se comprometerá a acelerar a eletrificação veicular no Brasil ou se absterá como o ex-presidente Bolsonaro, adiando ainda mais o que para muitos é irreversível.
Atualmente, há mais de 50 projetos de lei sobre eletrificação veicular em tramitação no Congresso Nacional à espera de um posicionamento mais claro sobre a estratégia do país para mobilidade urbana, o que somente demonstra a incerteza do tema no Brasil.
Na linha do que poderia ser liderado pelo presidente Lula, o PL 403/2022, que tramita no Senado, prevê isenção do imposto de importação para veículos elétricos e híbridos – uma possível solução para algumas montadoras. Por isso, aparentemente, o aceno do Senado para os carros elétricos é mais evidente do que do próprio presidente da República.
Ademais, após a recente reeleição do senador Rodrigo Pacheco para a presidência da Casa, há uma expectativa de que esse tipo de pauta volte à tona, sobretudo pelo senador já ter endossado discursos de energia limpa, novas tecnologias e redução da carga tributária, inclusive ao figurar na COP 27 juntamente com outros colegas, como a senadora Daniella Ribeiro (autora do PL 5590/2019, que também trata de eletrificação veicular).
Na verdade, é notório que a variedade energética brasileira é um limitador para a difusão dos carros elétricos, pois há divisão de esforços, logo os mercados se veem competindo por incentivos governamentais, especialmente pelo fato de o Brasil ser uma potência em biocombustíveis (o etanol, por exemplo), cuja premissa também é reduzir a emissão de CO2.
Ora, embora o programa Rota 2030 (criado durante o governo Temer) já preveja incentivos para veículos elétricos (inclusive tributários), ainda critica-se a ausência de um plano nacional de mobilidade que privilegie a eletrificação e siga a tendência global, que foi ratificada pelo recente anuncio do presidente dos EUA, Joe Biden, sobre o aporte de US$ 900 milhões na produção de carros elétricos no país, visando cumprir o compromisso público norte-americano com a redução de CO2 até 2030.
Infelizmente para as montadoras, apesar de já ter havido um crescimento de 41% na venda de carros elétricos no Brasil em 2022, é certo que o Brasil ainda está muito distante dos destaques mundiais em eletrificação, como a Noruega, que já possui maioria de modelos elétricos em sua frota, por exemplo.
De fato, ainda não se sabe como Lula reagirá à pressão das montadoras pela eletrificação, mas é certo que muitas empresas já se anteciparam e estão investindo para que, independentemente do apoio governamental, os carros elétricos sejam uma realidade no Brasil, sobretudo através de aplicativos de transporte.
Tal movimentação do mercado apenas demonstra o seu anseio pela previsibilidade na eletrificação nacional, que pelo menos já conta com a regulamentação dos postos de recarga elétrica por meio da Resolução Aneel 1.000/2021. Ou seja, mais pressão para o atual presidente.
Porém, é possível que Lula tenha posicionamento neutro e opte por ter o melhor dos dois mundos, ao conceder incentivos para tecnologias que utilizem energia elétrica e biocombustíveis – o que seria aceitável para parte da sociedade, mas talvez não represente o avanço esperado por aqueles que cobram a eletrificação do governo, como a ABVE.
Assim sendo, talvez ocorra exatamente o que o ex-ministro de Minas e Energia do governo Bolsonaro, Bento Albuquerque, já havia ensaiado fazer quando disse em 2019 que o carro elétrico não deveria ser movido exclusivamente por baterias, mas por etanol ou gás natural.
De fato, a única verdade sabida é que a comunidade global clama pela eletrificação nos mais renomados palcos pró-sustentabilidade, a pauta ambientalista de Lula está em xeque e se o Brasil quiser adotar a eletrificação como padrão para os próximos anos deverá implementar robustos incentivos governamentais.
Quem será o vencedor desse debate político-energético, os biocombustíveis ou a eletrificação?